Por melhores e mais profundos que sejam os planos estratégicos, grande parte deles termina numa gaveta
por Renata Bernhoeft
Ao longo da vida das famílias empresárias, as conquistas parecem ser fruto de garra, dedicação e muito trabalho, mas no decorrer desta história existe um momento, em que as estruturas se tornam maiores e mais complexas, e todos se dão conta: “Precisamos de planos. O crescimento ocorreu de forma intuitiva, a trajetória está consolidada, sempre existiu uma clara liderança e agora temos mais envolvidos, precisamos de alinhamento: para onde vamos?”.
O primeiro desafio é vencer um paradigma histórico: de que planos nunca parecem ter sido necessários, e a grande prova disso é que o modelo do fundador foi bem-sucedido, porém, a continuidade vai requerer cada vez mais estruturação.
O próximo obstáculo a ser vencido é a premissa de que os planos deveriam estar concentrados num grande líder, ou apenas nos que estão envolvidos nos negócios. É preciso considerar a premissa da estrutura societária, à medida que as gerações avançam, o capital se pulveriza e isso demandará maior articulação para manter o envolvimento e a coesão do controle. Romper estas barreiras parece simples em teoria, mas, na prática, implica confrontar tradições de uma cultura histórica.
Vencidos os desafios iniciais, é nesse momento que todos se mobilizam, e se envolvem, para elaborar um plano de futuro, ou em termos empresariais, um planejamento estratégico. Esta etapa tende a ser motivadora e empolgante, um grande debate em torno de oportunidades, novas atitudes, inspirações para a mudança, visões desafiadoras; um sentimento similar a quando encontramos um bom programa para nossa mudança pessoal, um método que nos traga uma renovação da crença em nossa própria capacidade de superação.
Elaborar um plano estratégico com o envolvimento de gestores, sócios e familiares, já é por si só um diferencial competitivo. Ao chegar a este ponto, muitas famílias empresárias já estão com a sensação do dever cumprido. O que não enxergamos muitas vezes, é que o maior desafio não se trata de consolidar os planos. E sim, o que acontecerá em seguida, a implantação. Pois o que acontece, de fato, com os planos estratégicos? Por melhores e mais profundos que sejam, grande parte deles termina numa gaveta.
Qual a principal barreira que precisamos enfrentar? David H. Maister, renomado professor britânico, afirma que a maior barreira para a implementação de uma visão é coragem. Muitos não têm a coragem de se manter fiéis aos planos e objetivos que definiram e com os quais se comprometeram. Planejar é empolgante, ter uma atrativa visão de futuro. Já o cotidiano, não.
Parece óbvio que, se passarmos a maior parte do tempo fazendo algo que sempre fizemos, o resultado não irá nos conduzir na direção de novos objetivos. “Todos sabemos o que é correto fazer, a diferença entre atingir a média ou superar expectativas, está em ir além do básico, fazer mais, fazer sempre, manter a disciplina constante. Fazer o que é mais fácil não tem nada de imoral, mas significa que não vou obter os benefícios de um objetivo estratégico”, afirma Maister.
Obviamente resistir ao fácil é difícil. Temos que apostar em nós mesmos, alinhar e acreditar em nossa visão compartilhada. Ter a coragem, envolver e incentivar a todos, para mantermos nossas convicções. Acreditar na visão de futuro que fixamos para nós mesmos, é uma coisa. Viver com a garra necessária para atingi-la, é outra. Situações como esta são muito comuns. De fato, são inevitáveis. Todas as estratégias, em algum momento, envolvem uma troca entre fazer o fácil e conhecido, ou implementar a cada dia a visão de excelência que estabelecemos para nós mesmos. Se realmente desejamos chegar aos resultados definidos, devemos estar dispostos a fazer estas escolhas, agindo com crença total em nossa visão, caso contrário, não convenceremos ninguém mais. Em resumo, definir uma visão compartilhada traz um primeiro compromisso, realizá-la é uma tarefa que requer coragem contínua.
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