Família empresária Benchimol: uma trajetória de 83 anos
- hoft45
- há 1 dia
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As lições da primeira geração guiam, 8 décadas mais tarde, o avanço da família empresária Benchimol.

O passado que orienta o futuro
Em um contexto de guerras e imprevisibilidade, a Bemol foi fundada em 1942 em Manaus pelos irmãos Israel, Samuel e Saul Benchimol. Mais de 80 anos depois, a empresa é líder do setor varejista na Amazônia Ocidental, com uma rede de lojas de departamentos, farmácias, mercados e presença marcante no dia a dia de milhões de pessoas. Sua história demonstra que um negócio nascido da necessidade empreendedora pode, com muita dedicação e foco em seus clientes, prosperar e perenizar-se.
A origem do negócio mostra tanto a união familiar quanto a situação difícil da época. Isaac Benchimol, filho de imigrantes de ascendência judaico-marroquina, trabalhou nos seringais do interior da Amazônia. Ao fim do ciclo da borracha encontrava-se cheio de dívidas, que somente viriam a ser quitadas anos mais tarde. Em 1942, vendo seu filho Israel insatisfeito no trabalho, Isaac juntou os poucos recursos que tinha e emancipou Samuel. Assim, os filhos puderam formar uma sociedade e iniciar um negócio próprio. A mãe, Dona Lili, foi a primeira colaboradora da nova empresa e logo o terceiro irmão, Saul, se juntou à sociedade.
Ao longo de sua história, a família empresária soube transformar desafios em oportunidades, mantendo-se fiel aos valores de seus fundadores. A empresa, que nasceu como uma representação de produtos farmacêuticos, começou a expandir-se já em 1945 e, na década seguinte, passaria a comercializar eletrodomésticos como geladeiras e fogões.
Depois, paralelamente ao surgimento da Zona Franca de Manaus, o negócio ganhou o nome Bemol, hoje uma referência nacional do varejo.
A família empresária conquistou seus clientes e colaboradores pela confiança e lealdade, nem sempre presentes no seu ramo de negócios. Isso se deu a partir da disseminação de valores, missão e propósitos no ambiente familiar.
Numa jornada de mais de oito décadas, os desafios foram inúmeros, mas três momentos cruciais ilustram a força dessa trajetória: a primeira sucessão, a implementação da governança e a expansão com inovação.
HORA DE ESTRUTURAR A CONTINUIDADE
A Bemol teve apenas três presidentes ao longo de 83 anos – todos eles membros da família empresária. A transição da primeira para a segunda geração, em especial, foi um dos momentos decisivos na história da Bemol. A primeira geração, além de construir um pensamento empresarial, legou princípios e diretrizes que orientaram a família no momento de sua sucessão.
Samuel Benchimol deixou um testemunho da sua geração no livro “Lembranças e Lições de Vida”, uma carta destinada às gerações vindouras com orientações de como conduzir os negócios. “Todos os colaboradores da empresa conhecem os princípios que regem a organização, e isso garante que estejam movidos pelos mesmos propósitos”, conta Ilko Minev, membro do Conselho de Administração e representante da segunda geração familiar.
Além das diretrizes empresariais, Samuel legou para sua família valores, aprendizados vividos e recomendações para as próximas gerações. “Esse livro tornou-se uma bússola, um guia sobre acertos e erros. Nele, encontramos a necessidade de uma contabilidade perfeita, por que evitar negócios com o setor público, o cuidado nas relações familiares e a importância da autonomia financeira”, relembra Ilana Benchimol Minev, filha de Ilko, membro da terceira geração que preside o Conselho de Administração e o Conselho de Família.
Quando a geração seguinte estava pronta e preparada para assumir desafios, fez-se a sucessão. Com Jaime Benchimol, filho de Samuel, assumindo a presidência, consolidaram-se os 5 princípios que nortearam a transição e a unidade familiar: integridade, respeito, energia, economia e melhoria contínua.
A empresa moderniza sua gestão e se mostra atenta às evoluções em tecnologia e informação realizando investimentos nesta área. Um processo formal de governança é então delineado com o crescimento da família, que evolui em uma proporção maior que o negócio.
O MOMENTO DE ESTRUTURAR O CRESCIMENTO
“No final dos anos 1990, decidiu-se implementar o sistema de gestão empresarial SAP, sendo o primeiro varejista a adotar esse sistema no Brasil. Isso aconteceu na época do bug do milênio, um período de muita imprevisibilidade. Mas entendeu-se que essa mudança era necessária e, com coragem, a Bemol foi em frente”, lembra Ilko.
A governança corporativa passou a ser desenvolvida de maneira formal nos anos 2000, quando a Bemol crescia, sua estrutura empresarial se tornava mais diversa e complexa e a empresa já perdera dois de seus fundadores. A família percebeu a necessidade de criar mecanismos que garantissem a transparência e a equidade de informações entre os sócios.
“O Brasil havia saído da hiperinflação e começava a ter um cenário mais previsível para os negócios. Foi quando se iniciou a implantação pioneira da ISO 9000 e percebeu-se que cada unidade da empresa tinha regras distintas para os mesmos processos. Isso fez enxergar, em um plano mais amplo, a necessidade de uma governança mais bem organizada”, conta Ilko.
Nesse período, a família trouxe o consultor Renato Bernhoeft para estruturar a governança, criando um Conselho Consultivo e instituindo o Conselho de Família. “Foi um aprendizado enorme. Delineou-se o primeiro acordo de acionistas, estabelecendo regras claras para a gestão do negócio e das relações familiares”, complementa Ilana.
A sucessão da segunda para a terceira geração, em 2018, coincidiu com uma nova fase nos negócios da família empresária. A Bemol mudou sua estrutura societária de limitada para sociedade anônima e fortaleceu seu Conselho de Administração com quatro membros independentes. Também foram implementadas novas políticas de compliance, viabilizando um canal independente de denúncias e a atualização do código de ética, frente a nova realidade do negócio.
Com Denis Benchimol Minev, neto de Samuel, na presidência, a estrutura robusta de governança mostrou-se essencial durante a pandemia. Quando a terceira geração assumiu a liderança, frente às adversidades decorrentes da crise sanitária, foi preciso tomar decisões estratégicas rapidamente. “Foi um momento muito desafiador, mas a governança bem estruturada deu suporte para atuar com agilidade e manter o negócio forte”, relata Ilana.
O LEGADO: UMA CULTURA DE EXPERIMENTAÇÃO
A cultura de inovação sempre esteve presente na Bemol. Foi um traço herdado dos fundadores e transferido primeiro para os 11 membros da segunda geração e, posteriormente, para os 19 da terceira. Essa mentalidade permitiu à empresa se manter na vanguarda, mesmo frente a muitas adversidades e em momentos de imprevisibilidade.
A Bemol expandiu seu portfólio de negócios nos últimos anos, modernizando-se mais ainda com a digitalização em todos os seus setores. O grupo passou a atuar no segmento de serviços financeiros, logística e conectividade. No setor de saúde, estabeleceu farmácias e clínicas médicas. “A pandemia revelou novas demandas dos clientes. Um exemplo foi responder com cestas básicas de alimentos quando ninguém podia sair de suas casas. Essa iniciativa se transformou em uma nova unidade de negócio, inclusive com mercados dentro de lojas”, explica Ilana.
A mesma postura se mantém até hoje, especialmente com o avanço da Inteligência Artificial. Trata-se de uma transformação cultural conduzida de forma sinérgica reunindo o Conselho de Administração, a alta gestão e os colaboradores, visando a adaptação da Bemol às tecnologias emergentes. “Recentemente, tivemos uma reunião com a OpenAI, em que nos relataram que a Bemol é a empresa brasileira que mais experimenta com IA. Isso mostra o quanto valorizamos a inovação”, destaca Ilana.
A família também mantém um olhar atento ao desenvolvimento da Amazônia, missão cumprida pela Bemol desde sua fundação. “Nosso avô acreditava que o desenvolvimento da região precisava se apoiar em quatro paradigmas: ser economicamente viável, politicamente equilibrado, ecologicamente equilibrado e socialmente justo. Mantemos esse compromisso e buscamos sempre criar soluções focadas no bem-estar da comunidade”, ressalta Ilana.
A trajetória da Bemol é um exemplo de como a governança estruturada e a cultura de inovação podem contribuir para a perenidade de uma família empresária. Desde a primeira sucessão, passando pela segunda e até a fase de digitalização da organização, conduzida pela terceira geração, cada desafio foi enfrentado com aprendizado e construção de memória.“A maior lição que aprendemos é que o sucesso de hoje não garante o sucesso de amanhã. Precisamos estar sempre atentos às mudanças e prontos para nos reinventar”, conclui Ilana. Com uma governança fortalecida e uma mentalidade inovadora, a Bemol segue construindo seu legado, mantendo-se fiel aos valores da família e preparando a nova geração para os desafios do futuro.

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